terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

História e cultura afro-brasileira e indígena (II)

Valdeci Batista de Melo Oliveira, Doutora pela USP, docente do colegiado de Letras da Unioeste. Contato: val.melo@uol.com.br

A escola estuda as etnias de modo superficial e distante do cotidiano vivo das relações e práticas sociais e culturais

Como é sabido, a escola é um espaço de poder, e é ,oficialmente, o único espaço de educação que tem a incumbência legal de fomentar a formação por meio do conhecimento científico. Por isso tem sido catastrófico a prática costumeira de se negar a existência de uma outra história que não seja aquela já esquematizada pelo pensamento dominante, cujo vórtice de importância centra-se na cultura e história eurocêntrica como matriz de construção das identidades. O que nela sobra para a diversidade etnográfica, ou de gêneros? O resultado é serem, historicamente, apresentadas e representadas como algo exótico, folclórico, que reforçam e estimulam a homofobia. Num país formado por diversas etnias essa prática escolar chega às raias da criminalidade e da alienação neurótica.

Por outro lado, a escola estuda as etnias de modo superficial e distante do cotidiano vivo das relações e práticas sociais e culturais, postura que também reforça estereótipos, naturaliza os problemas raciais e sociais, justificando-os por meio de recursos da psicologia (por exemplo: índio é preguiçoso, negro é violento, etc). É por isso que diversos movimentos sociais têm reivindicado mudanças e realizado ações educativas que propõem uma nova postura e agenda da escola em relação aos grupos étnico-raciais que compõem o povo brasileiro.

Mas mudanças são processos que demandam tempo e empenho, pois elas devem desvelar os silêncios da história que revelam os mecanismos e dispositivos de elaboração hegemônica do passado postos, justamente, para frear as mudanças e, portanto, são instrumentos de manipulação da memória coletiva pela cultura hegemônica. Nesse sentido, o esquecimento constitui uma vala comum onde repousam atores e personagens anônimos e episódios e ações marginais, suprimidos e eliminados pelas narrativas históricas ortodoxas e convencionais. E se a memória histórica do passado influencia o presente, o controle sobre essa memória histórica torna-se um sólido instrumento de dominação, em que os negros e índios foram e são jogados ao léu da sorte ou no cadinho mais baixo do diferente a serem temidos ou menoscabados.

Entretanto, se a história realiza-se em movimentos que, a princípio, poderiam ser diferentes, ou seja, a concepção benjaminiana de tempo perdido não se encontra no passado, mas no “futuro”, isto é, nos sonhos, nos desejos, nas aspirações do não-realizado, daquilo que não chegou a se concretizar, mas que ainda se encontra voltado para o porvir, esperando condições de possibilidades para emergir qual uma utopia retrospectiva, a Lei 11.645/2008, que torna obrigatório o estudo da História e Cultura Afro-brasileira e Indígena, na Educação Básica, traz à baila estas condições de possibilidades. Cabe a Unioeste aceitar o desafio de ajudar na construção do futuro que queremos outorgar em relação às identidades dos Índios e dos negros brasileiros.

O curso de especialização ofertado a todos os profissionais que buscam aperfeiçoamento profissional e diferencial no mercado de trabalho, pretende resgatar a luta dos afros–descendentes e dos povos indígenas que, por meio de pressões políticas e culturais, têm procurado fazer a inserção de sua cultura e história no currículo escolar brasileiro. Atitude que revela o reconhecimento da Educação formal como fértil campo de disputa das diversas classes sociais. Também se pretende demonstrar a importância e a fatia da cultura negra e indígena para a formação da sociedade brasileira, resgatando as suas contribuições nas áreas social, cultural, econômica e política, no que respeita à história do Brasil.

Nesse sentido, esta especialização pretende incorporar os conteúdos da História, da Literatura, da Arte e demais disciplinas acerca da cultura afro-descendente e indígena, como construtores da cultura brasileira tout court, não podem ficar restritos a propostas de transversalidade temáticas, mas devem ser conteúdos efetivos das grades curriculares e serem desenvolvidas para contribuir para o senso crítico dos alunos, professores e outros atores da educação.

Para tanto, é preciso implementar conteúdos e posturas filosóficas que contribuam para os professores repensarem seus valores e conceitos sobre as diversas etnias que compõem a sociedade brasileira, bem como repensarem seus propósitos com os alunos, reformulando toda uma forma de pensar e ver a cultura afro-brasileira e indígena, com vistas a desenvolver uma pedagogia do oprimido à Paulo Freire com referências às histórias das culturas afro-descendente e indígena, desde o período pré-colonial até a contemporaneidade.



*Publicado originalmente no suplemento especial "Educação", do jornal "O Paraná", edição 464, página 07, 13/02/2009.


Nenhum comentário: